O
primeiro dia.
Este.
Do resto da vida aqui, que espero longa, mas não demasiado para não
agoniarem.
O
primeiro dia de Dezembro.
Da
Restauração. Da afirmação da nossa vontade, do retomar das
tradições portuguesas após a quebra de promessas ao povo por um
Rei espanhol. O dia que agora querem esquecer.
Depois,
todos os nossos outros primeiros dias: de escola, de férias, de
namoro, de trabalho, de casados, até os primeiros de Abril.
Os
primeiros dias têm um sabor especial que as nossas memórias
conservam teimosamente mesmo quando queremos esquecer.
Dos
bons primeiros dias retemos o cheiro a cabedal da pasta nova, os
sorrisos que nos recebem, o dar de mão e o beijo desajeitados, a
visão súbita do mar, a emoção da estreia…
Dos
maus primeiros dias, a ansiedade que nos faz parecer tontinhos
precisamente quando queremos deixar boa impressão e parece que a
fala, a boca, a língua, decidem todas de repente ter vontade
própria, indomável, resolvendo sair-se com disparates que nem
sonhávamos ser capazes de dizer, ou então ficam mudas quando o
cérebro estava cheio de frases preparadas vários dias antes para a
solenidade da ocasião. Pior ainda quando, nem mudas nem tagarelas,
todas elas se entaramelam numa gaguez aflitiva acompanhada de gotas
de suor que nem sequer tinham sido convidadas.
Está
tudo dito. Vai ser assim.
Nota
de pé de página em jeito de intróito
DIA
0
(há
sempre, desde que os árabes resolveram dar nome ao nada)
Achou
o João Marchante que eu devia aqui escrever. Sobre o quê?
perguntei-lhe, derretida. Quotidiano, ironia e monarquia, respondeu
sem hesitação. Ena! Conhece-me de ginjeira…
Escreverei
com a maré dos dias, uns melhores que outros, alguns de raiva,
outros de puro divertimento.
Ai!
Disciplinar uma mente indisciplinada que já tem idade que chegue, é
obra, mas tentarei cumprir. Prometo que tento.
Leonor Martins de Carvalho
Publicada a 27/01/2012 in Eternas Saudades do Futuro